O Estadão traz em sua edição deste domingo (10/jul/2011) matéria que aponta subsistirem, apenas no Rio de Janeiro, 60 mil homicídios sem elucidação ocorridos na última década [1]. Os dados, segundo registra a matéria, se mostram compatíveis com a realidade brasileira, que aponta uma taxa de solução de homicídios de apenas 8%, ou, em termos práticos, somente 4 mil dos 50 mil assassinatos registrados anualmente no país, conforme os dados adotados oficialmente no Mapa da Violência 2011.
Não há dúvida de que a solução dos homicídios é fator primordial para se entender o fenômeno da violência no país. Sem conhecer o assassino, as condições do crime e, em muitos casos, nem mesmo a identidade da vítima – como se aponta na matéria -, qualquer perfil que se queira traçar dos homicidas brasileiros não passará de puro “achismo”.
Com índices tão baixos de elucidação criminal, não há como se afirmar do que decorrem a maior parte dos homicídios registrados no país, principalmente porque este é um dado estatístico de dupla filtragem. Quando um homicídio não é esclarecido, de logo se pode colher a conclusão de que o crime não decorre de uma relação interpessoal entre vítima e homicida, como acontece nas raramente fatais, mas tão invocadas, brigas de vizinho, de marido e mulher, nos conflitos de trânsito e até mesmo nos ainda mais raros acidentes com armas de fogo, quando a culpa sempre é, de forma simplista, atribuída à demonizada arma, e nunca a quem puxou o gatilho.
Crimes frutos de relação interpessoal são facilmente elucidados. Nestes, felizmente escassos, casos, o homicida não é um criminoso contumaz, não tem um perfil de fuga das autoridades, tem uma vida da qual não pode simplesmente se desprender. Mas esses crimes, de fácil elucidação, dividem um universo estatístico reduzidíssimo, de apenas 8% do total, no qual também se incluem todos os outros delitos de morte praticados pelos criminosos contumazes que são elucidados pelas forças policiais – latrocínios e homicídios, simples ou qualificados (como nas chacinas e nos crimes de mando).
Ao se reconhecer que apenas 8% dos homicídios são elucidados, já se estabelece o primeiro filtro estatístico para o total destes crimes, com a exclusão da possibilidade de que os outros 92% deles decorram de relações interpessoais, quando, repita-se, é fácil a elucidação. Em outros termos, os números mostram que, em pelo menos 92% dos homicídios, vítima e assassino não possuem nenhuma relação prévia, justamente o que torna muitíssimo mais difícil o esclarecimento do crime.
Não se conseguindo elucidar 92% de crimes de morte, torna-se absolutamente impossível se alcançar um perfil criminal confiável no país. Apenas para se ter uma ideia, países europeus e os Estados Unidos vivenciam taxas de elucidação de 70% a 80%, tendo números absolutos muitíssimo mais baixos que os brasileiros – não por acaso.
Essa realidade nacional compromete sobremaneira a definição das políticas públicas na área de segurança. Não se pode eficazmente combater o que não se conhece sequer em 10% de sua extensão.
A única conclusão positiva que se pode extrair de uma realidade tão triste é a ratificação de que, definitivamente, quem mata não é o cidadão comum, pois o Brasil não é um país de assassinos. Se fosse, as taxas de elucidação seriam bem maiores.
Resta é identificar quem são os efetivos homicidas, que fazem na sociedade suas vítimas, e combatê-los. O problema do Brasil não é de violência generalizada, é um problema de criminalidade contra uma sociedade cada vez mais indefesa. Falta de solução de crimes é a maior causa da impunidade e esta é a maior incentivadora da crescente e assustadora criminalidade em que estamos envoltos, principalmente quanto aos assassinatos.
O que se precisa tirar do futuro do Brasil são os criminosos, mas para isso é necessário identificá-los.
* Fabricio Rebelo é bacharel em direito, assessor jurídico, pesquisador em segurança pública, coordenador regional (Nordeste) e diretor nacional para Colecionadores, Atiradores e Caçadores da ONG Movimento Viva Brasil.
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